A aplicação da súmula 410 do STJ mesmo após a vigência do CPC/2015
No cumprimento de sentença em que existe obrigação de fazer ou não fazer, o Juízo sempre estipula a título de cláusula penal uma multa por eventual descumprimento da ordem judicial ali contida. Nessa seara, para a incidência da multa basta que se configure o descumprimento, e, para ser configurado o descumprimento, a parte que foi compelida pelo juízo a fazer ou a deixar de fazer o quanto determinado, precisa tomar ciência da decisão para decidir se irá cumpri-la ou não dentro do prazo estipulado.
Assim, somente após a ciência e encerramento do prazo concedido para o cumprimento da decisão proferida é que se incide as astreintes, conforme preconiza o art. 537 do CPC, senão vejamos: Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.
- 4º A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado. (Grifei)
Desta forma, a análise da ciência da decisão se faz mais do que necessária, haja vista que é a partir dela que será definido o termo inicial para cumprimento da obrigação, ou seja, inicia-se a contagem do prazo para o cumprimento da decisão. Assim, na ausência de cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer no prazo estipulado, incidir-se-á a multa.
Nesse cenário, existia uma celeuma até o final do ano de 2018 no que diz respeito de como seria dada a ciência da decisão. Seria da intimação pessoal do devedor ou da intimação eletrônica do seu Procurador (advogado) via publicação? Entendendo pela intimação do devedor por seu procurador através da publicação eletrônica, a qual se daria por publicação via diário oficial, a partir daí se daria o termo inicial para cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, seguindo o entendimento do artigo 513, §2º, I do CPC/2015. In verbis:
Art. 513. O cumprimento da sentença será feito segundo as regras deste Título, observando-se, no que couber e conforme a natureza da obrigação, o disposto no Livro II da Parte Especial deste Código.
(…)
- 2º O devedor será intimado para cumprir a sentença:
I – pelo Diário da Justiça, na pessoa de seu advogado constituído nos autos; (Grifei)
Entretanto, o entendimento majoritário e pacífico na Jurisprudência do STJ antes da vigência do CPC/2015 e que permanece até hoje, é o contido na Súmula 410 do STJ, a qual foi aprovada em 16/12/2009, com base no artigo art. 632 do CPC/73, que reconhece como sendo o termo inicial para cumprimento da obrigação de fazer e não fazer a intimação pessoal do devedor, senão vejamos:
Súmula 410 – A prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. (Súmula 410, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25/11/2009, DJe 16/12/2009, REPDJe 03/02/2010) (Grifei)
Desta forma, achava-se que com a vigência do inciso I do parágrafo 2º do artigo 513 do novo CPC/2015 estaríamos diante da revogação da Súmula 410 do STJ e diante de uma prestação jurisdicional isonômica entre os procedimentos de cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa (artigos 523 até 527 do CPC/2015) e do cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de fazer ou não fazer (artigos 536 e 537 do CPC/2015).
Entretanto, pairou sobre o tema muita divergência, pois mesmo após a vigência do CPC/2015 a Súmula 410 do STJ continuou a ser aceita pela Suprema Corte e não perdeu seus efeitos. Existiram diversos julgados e muitas foram as decisões sobre o tema. Enquanto algumas seguiam o quanto disposto no inciso I do § 2º do artigo 513 do CPC/2015, outras seguiam o entendimento da Súmula 410 do STJ, mesmo após a inovação legislativa.
Nesse cenário, em importante julgado ocorrido em 19/12/2018, em um Embargos de Divergência, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça proferiu o entendimento de que mesmo na vigência do CPC atual é necessária a prévia intimação pessoal do devedor para a cobrança da multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Vejamos:
PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DESCUMPRIMENTO. MULTA DIÁRIA. NECESSIDADE DA INTIMAÇÃO PESSOAL DO EXECUTADO. SÚMULA 410 DO STJ. 1. É necessária a prévia intimação pessoal do devedor para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer antes e após a edição das Leis n. 11.232/2005 e 11.382/2006, nos termos da Súmula 410 do STJ, cujo teor permanece hígido também após a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil. 2. Embargos de divergência não providos. (STJ – EREsp: 1360577 MG 2012/0273760-2, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 19/12/2018, CE – CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 07/03/2019) (Grifei)
Assim, nota-se que mesmo após a vigência do Código de Processo Civil de 2015, a doutrina, ao comentar sobre a execução das obrigações de fazer ou de não fazer, mais especificamente sobre o termo inicial de incidência da multa, acata o enunciado sumular em tela. Vejamos ensinamento do Doutrinador Daniel Amorim:
“Na realidade, a multa passa a incidir desde o momento que vencer o prazo de cumprimento voluntário da obrigação, mas desde a citação do executado já funcionará como forma de pressão psicológica. Nos termos de entendimento sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça “a prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer” (Súmula 410/STJ)”. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo código de processo civil comentado artigo por artigo. Salvador: Editora Juspodivm, 2016, p.1.285)”.
Por fim, entende-se que a multa incide desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão do magistrado e deve incidir até o regular cumprimento da obrigação por parte do devedor. Contudo, frise-se, é necessária a intimação pessoal do devedor para lhe conferir ciência da decisão, no sentindo de validar a cobrança da multa em um possível descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, nos termos da Súmula 410 do STJ, cujo teor permanece inalterado mesmo após a vigência do Código de Processo Civil de 2015.
Artigo Dr Lucas Andrade